terça-feira, 5 de agosto de 2014

Punho de Rede

Hoje, em umas das vezes que entrei em minha sala de trabalho, presenciei meus colegas conversadores falando sobre dormir em rede. Um deles, falastrão, resmungava: "eu não gosto de dormir em rede, pô! Acordo todo quebrado!". E lá pelas tantas do papo rolando um detalhe me chamou atenção e resgatou lembranças de minha infância.

A conversa era mais ou menos essa: "Como assim, consertar punho de rede? Tem como?"
Quando eu era criança pequena lá na casa da minha vó, eu, minha mãe e meus irmãos dormíamos em redes, e quando o punho delas inevitavelmente arrebentavam, minha mãe ia ao comércio e comprava punhos novos para substituir (comprar rede nova estava fora de cogitação e condições monetárias).

A imagem ainda está muito viva na minha memória...
Quando chegava da escola minha mãe sentenciava: "vai trocar de roupa que tu vais me ajudar a trocar o punho da rede do teu irmão" (ou irmã, ou a minha...). Ela então sentava à minha frente com a rede nas mãos, colocava o pé direito entre as minhas pernas no banco em que eu ficava sentada e iniciava o ofício de tecelã. A cada volta, cabia a mim a "árdua" tarefa de passar a volta de corda pelo dedão do seu pé, formando lenta e perfeitamente uma teia. Ao final, eu precisava segurar firme, entre minhas mãos miúdas, o elo que seria "encapado", a parte que seria dependurada no "S" ou escápula.

Entre um tear e outro, conversas de mãe atravessavam meus ouvidos e eram cravadas na minha memória: histórias, conselhos, puxões de orelha, cobranças, lamentos, músicas ou apenas o silêncio. Eu e ela, ali, no ofício de ser mãe e filha. 

Hoje entendo perfeita e metaforicamente o que aquele ato me ensinava: reconstruir o que falta e não destruir ou substituir o que sobrou.

Eu vivi um momento de felicidade intensa ao relembrar desses momentos de simplicidade que muita criança desta era moderna não tem noção da beleza e do quanto eles ajudam na construção do caráter de um ser humano.

Que possamos empunhar mais redes em nossos dias, ter mais tempo de sermos filhos e de nossas mães serem mães.



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Olha Clau...